Nos 28 artigos da Política Nacional de Mobilidade Urbana, sancionada
em 3 de janeiro deste ano, não existem referencias às palavras
“pedestre” ou “calçadas”. Ou seja, caminhar não é uma modalidade de
mobilidade reconhecida. Em 22 de setembro comemora-se o Dia Mundial sem
Carro, uma iniciativa para estimular as pessoa a repensarem a
(i)mobilidade urbana. No entanto, a queixa principal dos que se recusam
a abandonar o carro é a “falta de transporte público de qualidade”,
esgrimida até mesmo por quem sequer sabe por qual porta se entra em um
ônibus.
Deixar o carro em casa é uma necessidade para a melhoria na
mobilidade. Isso significa ampliar o número de pessoas caminhando pelas
calçadas das cidades, seja para dirigirem-se aos pontos do transporte
público, ou para chegarem aos destinos finais sem a utilização de
transporte motorizado. Uma pergunta ainda sem resposta é como seria
possível melhorar a mobilidade urbana sem investimento em calçadas e
equipamentos públicos que permitam o caminhar seguro de pedestres?
O ex-prefeito de Bogotá, capital da Colômbia, cunhou uma frase
excelente: “Cidade avançada não é aquela onde os pobres andam de carro,
mas sim aquela onde os ricos andam no transporte público”. Não é fácil,
mas é possível e apenas assim as cidades podem ter mobilidade
sustentável, aquela que inclui pedestres, ciclistas, passageiros de
ônibus, metrô, trem e táxis, além dos carros em trajetos necessários e
urgentes. A construção de “Caminhos Urbanos” para caminhantes, espaços
com padronização de piso, iluminação, segurança, sombreamento, água
potável e outros confortos para os cidadãos pode ser uma forma de
estimular as pessoas a deixarem os carros em casa.
As cidades precisam tornar-se mais amigáveis para caminhantes,
aquelas pessoas que optam por uma mobilidade mais saudável e que
contribuem para a qualidade de vida da sociedade onde estão inseridas. A
mobilidade urbana deveria ser vista como um direito coletivo e o uso de
automóveis no cotidiano dos trajetos casa-trabalho-casa-escola deve ser
desestimulado. Em tempos de eleição para prefeito, os projetos e
modelos de mobilidade urbana deveriam estar no centro da pauta das
campanhas.
É possível reverter a tendência de agravamento dos congestionamentos
nas cidades. Em São Paulo, por exemplo, há dados que apontam uma perda
de tempo de até 3 horas por dia em trajetos casa-trabalho-casa feitos de
automóvel, e até 5 horas por dia em transportes públicos de baixa
qualidade. São números impossíveis de serem mantidos ou aumentados sem o
colapso da estrutura econômica da cidade. Pesquisa feita Secretaria
estadual de Transportes mostra que os congestionamentos já custam perto
de R$ 5 bilhões ao ano para a cidade. Portanto, esse é um número que
deveria ser levado em conta na hora de planejar a mobilidade.
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Caminhar pela cidade é um direito de todos, mas as prefeituras não
assumem esse direito, privatizando a obrigação de cuidar das calçadas.
Sem obedecer a padrões de qualidade, de segurança e de materiais, as
calçadas tornam-se obstáculos à mobilidade urbana sustentável. Se uma
rua tem um buraco logo a mídia do cotidiano, rádios, TVs e jornais
alertam e cobram da prefeitura “providências urgentes”. Se uma calçada
tem um buraco, um desnível intransponível ou uma inconformidade
qualquer, a queixa é individual, do cidadão/caminhante e perde-se em um
labirinto burocrático que pode simplesmente fazer desaparecer a demanda.
Existem dados preocupantes em relação aos desequilíbrios entre o uso
do espaço urbano e dos recursos públicos entre a mobilidade em
automóveis e a mobilidade não motorizada, ou seja, pedestres e
ciclistas. Sendo que os ciclistas já estão conseguindo algumas ciclovias
e ciclofaixas em diversas cidades, enquanto os pedestres não são
organizados e não tem poder de pressão, apesar de representarem mais de
30% de todas as viagens em cidades como São Paulo, sem contar os
caminhantes que se destinam ao transporte público. Os carros representam
pouco mais de 30% das viagens em São Paulo e consomem quase 80% dos
recursos gastos em mobilidade na cidade.
Em agosto passado, a presidenta Dilma Roussef anunciou investimentos
de 32,7 bilhões de reais em projetos de mobilidade urbana nas grandes
cidades brasileiras, principalmente obras relacionadas à Copa do Mundo. É
uma excelente oportunidade para estabelecer metas em relação ao
transporte não motorizado e fazer com que as prefeituras assumam sua
responsabilidade em relação às calçadas, que são deixadas aos
proprietários dos imóveis, apesar de não fazerem parte do terreno e
serem sempre abandonadas ao nada ou ao calçamento de menor preço e baixa
qualidade.
(Envolverde)
Fonte: Carta Capital
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